“É inútil lutar
contra o destino irremediável que me persegue.”
Mais uma vez escrevo observando as ondas do mar. A única
diferença é que da outra vez, a caminho de Recife, eu fugia de todos os
infortúnios e tinha esperança de um dia melhor; agora, volto direto para o
cativeiro que tanto abomino. O pássaro volta, sem outras opções, para a jaula,
para viver aprisionado, fadado a assistir o sol se por de longe, inalcançável
mais uma vez. Quando se prova a liberdade, ainda que apenas uma gota, o cárcere
torna-se insuportável, pior do que a própria morte.
Quando despertei de meu desmaio ainda encontrava-me no
baile. Uma insegurança misturada com medo me tomou quando percebi onde estava e
o que estava acontecendo. Temia que seria levada de volta para o meu cativeiro,
para o meu algoz, ali mesmo, mas , fortuitamente e para alegria de meu pobre
coração, Álvaro interveio a meu favor, me protegendo.
De volta à nossa humilde residência, tive que me esconder
no cômodo vizinho à sala, enquanto Álvaro resolvia os problemas com a polícia
e, pelo que consegui escutar, com Martinho também. Quando o silêncio voltou a
reinar na casa, me aventurei para fora do aposento e deparei-me com Álvaro
sentado junto à mesa com a cabeça entre as mãos, parecendo desolado.
Questionei-o sobre o que o abatia e a resposta, ao mesmo tempo em que enchia
meu coração de alegria, também o despedaçava: estava tentando encontrar um
jeito de libertar-me do abismo da escravidão, afirmando que teria para sempre
seu amor e proteção. Foi só ouvir essas palavras que um profundo arrependimento
surgiu no âmago de meu ser, não me sentia digna de tais declarações. Tentei
colocar juízo em sua cabeça e fazê-lo ver que deveria amar uma mulher que fosse
merecedora de tais sentimentos, mas acabamos nos perdendo entre nossas juras de
amor e, pela primeira vez, falei que o amava, amo-o ainda, com todas as letras.
Esse momento mágico foi interrompido por batidas decididas na porta, então tive
que voltar para o quarto.
O meu terror foi total quando, ao escutar através da
fresta da porta, percebi que o visitante era na verdade meu algoz, Leôncio, que
tinha vindo arrastar-me de volta para o inferno que era meu cárcere, de volta
para suas garras. Aguardei apreensiva pelo desenrolar do diálogo. Quando
percebi que a situação estava se tornando perigosa, com ameaças de morte sendo
proferidas, resolvi intervir e adentrar o cômodo.
Sabia que, infelizmente, o amor não seria suficiente para
livrar-me das condições definidas para mim pela vida, então, ao ver Álvaro
ameaçado pelo poder e pela lei que estavam a favor de meu senhor, não tive
outra escolha senão me entregar. Assim, fui separada de meu querido, ouvindo de
sua boca uma promessa de um reencontro breve, pois nada no mundo poderia
separar um sentimento tão forte quanto o nosso.
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